Gênero Epistolar - Carta de Mário de Andrade












Caro Leitor,



Ao pesquisar o gênero epistolar, primeiro decidi desenvolver o meu significado de carta: Uma carta é uma mensagem que revela a intimidade do remetente no momento em que este escreve.

Ao lermos uma carta entramos em conexão com alguém de uma forma muito particular. A carta nos introduz no universo do outro, nos remete aos acontecimentos, aos sentimento e aos pensamentos de quem escreve.

Na Internet encontrei um trabalho muito interessante da pesquisadora Ucy Soto, no qual consta a história do surgimento do gênero epistolar e sua consolidação. O texto inicia justificando que “compreender como se constitui um gênero enriquece a percepção que temos sobre ele em muitos aspectos”.

Convencida, resolvi fazer um resumo desse texto e inserir nesta, que tem por motivo imediato tratar de si mesma. Espero que lhe agrade e que sirva, o resumo, ao propósito de sua visita.




A forma epistolar e seus sentidos foram se definindo conjuntamente com as práticas do cristianismo e a expansão das artes notarial e legislativa durante a idade média. É neste período que acontece o que poderíamos chamar de “a invenção” do que hoje denominados carta.

Antes de o cristianismo introduzir no ocidente uma correspondência sagrada (as epístolas), o eixo importante das discussões se dava através da retórica clássica, primordialmente oral, na Grécia Antiga.

"As epistolas de Paulo" (150 d.C) é o primeiro conjunto de escrituras sagradas do cristianismo, antes mesmo dos Evangelhos e asseguravam a mediação entre o céu e a terra, entre Deus e os homens, por escrito.

No começo do século XII a prática epistolar já se encontrava difundida fora dos muros da igreja. A carta funciona no mundo laico medieval como um intermediário entre o direito civil e a arte notarial. É deste período a fixação de umas das normas que mais caracterizam o texto epistolar: a obrigatoriedade de se citar o nome do destinatário antes do nome do autor da carta.

O grande apogeu da arte epistolar ocorre na Itália, quando surgem os mestres epistolares, intelectuais ligados a instituições universitárias que escreviam cartas e tratados sobre essa arte. Durante esse período os tratados epistolares buscavam propor modelos de cartas que pudessem servir de exemplo, gerando assim, no ano de 1260 , o primeiro manual de língua moderna, escrito por Bruno Latini.

Com o desenvolvimento dos estados nacionais nos últimos anos da idade média a comunicação entre o indivíduo e a justiça, feitas através das cartas, perde espaço e as cartas, então, passaram a esfera privada como cartas de cumprimentos, agradecimento, cartas de amor, entre amigos e hoje, o gênero epistolar da atualidade, o e-mail.




Imaginei que este texto vinha ao encontro de nosso assunto. Espero que tenha acertado. Espero também que me perdoe a intimidade ao escrever-lhe, em gênero epistolar, de forma tão coloquial e direta, mas havia tanto que não praticava “a arte” de escrever uma carta que não resisti.

Não lhe enviarei a original, grafada a próprio punho, a manterei nas páginas de meu caderno, pois não me atrevo a tamanha liberdade temendo uma severa punição com sua evasão de meu blog.

Sem mais, subscrevo-me atenciosamente desejando que essa o encontre gozando de muita saúde, paz e “sensibilidade”.

Abraços,
Angela Mendez.

PS: Envio-lhe anexo, uma carta de Mário de Andrade, que em minhas pesquisas descobri ser a figura principal em termos de correspondência literária pelo seu “gigantismo epistolar” . As cartas entre escritores nos fornece um material importantíssimo para o conhecimento do fazer literário e do sentimento do autor por sua obra.




Trecho da carta de Mário de Andrade a Álvaro Lins, ao concluir o livro Macunaíma

Pouco importa, si muito sorri escrevendo certas páginas do livro: importa mais, pelo menos para mim mesmo lembrar que quando o herói desiste dos combates da terra e resolve ir viver “o brilho inútil das estrelas”, eu chorei. Tudo nos capítulos finais foi escrito numa comoção enorme, numa tristeza, por várias vezes senti os olhos umidecidos, (grafia do autor) porque eu não queria que fosse assim! E até hoje ( é o livro meu que nunca pego, não porque ache ruim, mas porque detesto sentimentalmente ele), as duas ou três vezes que reli o final, a mesma comoção, a mesma tristeza, o mesmo desejo amoroso de que não fosse assim, me convulsionam.



*Carta a Álvaro Lins, datada de São Paulo 1942 publicada em Mário de Andrade escreve cartas a Alceu Meyer e outros. Org Lygia Fernandes. P. 43-44.