“Quando dizemos
que “simplesmente não falamos a mesma língua”, referimo-nos a algo mais geral:
temos valores imediatos ou diferentes tipos de valoração, ou temos consciência,
às vezes de maneira intangível, de formações e distribuições diferentes de
energia e interesse”. (WILLIAMS, 2007, p.28)
Quando alguém usa a palavra cultura, a que realmente está se
referindo?
Cultura [culture] é uma das duas ou três palavras mais complicadas
da língua. Isso ocorre em parte por causa de seu intricado desenvolvimento
histórico em diversas línguas europeias, mas principalmente porque passou a ser
usada para referir-se a conceitos importantes em diversas disciplinas
intelectuais distintas e em diversos sistema de pensamento distintos e
incompatíveis.
A p.i. é o latim cultural, da
p.r. colere. Colere tinha uma gama de
significados: habitar, cultivar, proteger, honrar com veneração. Alguns desses
significados finalmente se separaram nos substantivos derivados, embora ainda
haja superposições ocasionais. Dessa maneira, “habitar” desenvolveu-se do latim
colonus até chegar a colony [colcônia]. “Honrara com
veneração” desenvolveu-se do latim cultus
até chegar a cult [culto]. Cultura assumiu o sentido principal de
cultivo ou cuidado, incluindo, como em Cícero, cultura animi, embora com
significados medievais subsidiários de honra e adoração. [...] O sentido
primordial referia-se, então, a lavoura, isto é, o cuidado com o crescimento
natural.
Em todos os primeiros usos, cultura era substantivo que se referia
a um processo: o cuidado com algo, basicamente com as colheitas ou com os
animais. [...] A partir do S16, o cuidado com o crescimento natural ampliou-se
para incluir o processo de desenvolvimento humano e este foi o sentido
principal até o início do S19 [...]. Em diversos momentos do desenvolvimento,
ocorreram duas mudanças cruciais: Em primeiro lugar, certo grau de adaptação à
metáfora, que tornou direto o sentido de cuidado humano; em segundo lugar, uma
extensão dos processos específicos ao processo geral, que a palavra poderia
carregar de modo abstrato. Naturalmente, é a partir deste último
desenvolvimento que o substantivo independente cultura iniciou sua complicada
história moderna, mas o processo de mudança é tão intricado, e os sentidos
latentes às vezes se aproximam tanto, que não é possível afirmar uma data
definitiva.
No francês, até o S18, cultura
estava relacionada ao conceito de civilização. Seu principal uso era, então,
como sinônimo de civilidade: primeiro no sentido abstrato de um processo geral
de tornar-se “civilizado” ou “cultivado”; segundo no sentido que já fora
estabelecido para civilização pelos historiadores do Iluminismo, como uma
descrição do processo secular de desenvolvimento urbano. Então, Herder
introduziu uma mudança decisiva de uso, escrevendo, a respeito de Cultur: “nada é mais indeterminado que
essa palavra e nada mais enganoso que sua aplicação a todas as nações e a todos
os períodos”.
(Referência: WILLIAMS,
Raymond. Palavras-Chave: um
vocabulário de cultura e sociedade. SP: Boitempo, 2007).
E você, quando fala de cultura refere-se a que, afinal?
Vamos problematizar? O que é cultura?
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