Gêneros Discursivos / Textuais



"[...] engloba uma análise do texto e do discurso e uma discrição da língua e visão da sociedade, e ainda tenta responder a questões de natureza sociocultural no uso da língua de maneira geral. O trato dos gêneros diz respeito ao trato da língua em seu cotidiano nas mais diversas formas. [...] podemos dizer que os gêneros são uma “forma de ação social”. (MARCUSCHI, 2008)
Antes de partirmos para uma definição do que chamamos de gênero textual (discursivo), devemos primeiramente entender a noção de gênero que, segundo estudiosos, é o mesmo que entender a própria noção de língua.

Para Mikhail Bakhtin, a incalculável diversidade linguística se estratifica em diferentes formas, mais ou menos estáveis, as quais podemos chamar de gêneros, isto é, manifestações da língua tipificadas por características formais recorrentes e correlacionadas a diferentes atividades sociais. Assim, também a escrita se estratifica em gêneros, uma forma convencional da linguagem, à qual atribuímos algum papel social, algum valor, alguma função.

Temos então a noção do que é gênero e de sua vitalidade para a comunicação. Nós nos comunicamos, falamos e escrevemos em gêneros, ou seja, não aprendemos a língua, mas alguns gêneros da língua. Assim que passamos a fazer uso da língua, da fala, passamos a fazer uso da estrutura da linguagem, ou melhor, dos diversificados gêneros linguísticos.

Antes de ser alfabetizada, a criança já é letrada, pois faz uso da linguagem para se comunicar e a conhece em sua estruturação, mesmo sem a noção teórica dos gêneros discursivos. Sobre a nossa atividade comunicativa e, portanto, a constituição dos gêneros, Bakhtin afirma que:

Para falar, utilizamo-nos sempre dos gêneros do discurso, em outras palavras, todos os nossos enunciados dispõem de uma forma padrão e relativamente estável de estruturação de um modo. Possuímos um rico repertório dos gêneros do discurso orais (e escrito). Na prática, usamo-los com segurança e destreza, mas podemos ignorar totalmente a sua existência teórica [...]

Podemos agora definir e caracterizar o gênero textual. Na perspectiva bakhtiniana os gêneros textuais possuem uma forma de composição, um conteúdo temático e um propósito comunicativo. O gênero textual, grosso modo,  define-se por determinadas características de estruturação textual, forma, linguagem, tamanho, conteúdo e também, ou principalmente, pela sua função ou fim específico.

Como os gêneros textuais são respaldados nas práticas sociais, na dinâmica da vida social e cultural, eles podem sofrer variações em suas unidades temáticas, forma composicional e estilo. Não são, os gêneros textuais, conforme afirma Ingedore Koch, instrumentos rígidos e estanques.
Marcuschi não só concorda com a flexibilidade dos gêneros textuais como alerta para a proliferação de gêneros novos dentro de novas tecnologias, particularmente na mídia eletrônica. Esses novos gêneros, Marcuschi denomina gêneros emergentes (MARCUSCHI, 2008, p.198). Embora muitos desses gêneros emergentes não sejam novos, uma vez que constituem uma modificação ou adaptação dos gêneros existentes aos novos meios (suportes) e novos tempos, com a internet, muitos novos gêneros estão surgindo, sim .

Segundo David Crystal, em seu livro “A Linguagem e a Internet”, a internet transmuta de maneira bastante radical gêneros existentes e desenvolve alguns realmente novos. A internet, por assim dizer, é parte do que os teóricos denominam "suporte de gêneros textuais", ao qual Marcuschi dá a sua definição:

Entendemos aqui como suporte de um gênero um lócus físico ou virtual com formato específico que serve de base ou ambiente de fixação do gênero materializado como texto. Pode-se dizer que suporte de um gênero é uma superfície física em formato específico que suporta, fixa e mostra o texto. Essa idéia comporta três aspectos: a) suporte é um lugar; b) suporte tem formato específico; c) suporte serve para fixar e mostrar o texto .

A este fenômeno digital - os gêneros emergentes, podemos associar o exemplo dos gêneros apontados como primários e secundários. Devido à extrema heterogeneidade dos gêneros do discurso, resultado da infinidade de relações sociais que se apresentam na vida humana, Bakhtin optou por dividir os gêneros em dois tipos: Gênero Primário (simples) e Gênero Secundário (complexo). A heterogeneidade linguística é o que determina a subdivisão que se faz entre os gêneros.

Os chamados gêneros primários são aqueles que emanam das situações de comunicação verbal espontâneas, não elaboradas. Pela informalidade e espontaneidade, dizemos que nos gêneros primários temos um uso mais imediato da linguagem que transcorrem nos enunciados da vida cotidiana: na linguagem oral / conversação, diálogos com a família, reuniões de amigos, etc.

Nos gêneros secundários existe um meio para que seja configurado determinado gênero. Esse meio é normalmente a escrita. Logo, se há meio, dizemos que há relação mediata com a linguagem, se há meio, há instrumentalização. O gênero funciona como instrumento, uma forma de uso mais elaborada da linguagem para construir uma ação verbal em situações de comunicação mais complexas e relativamente mais evoluída: artística, cultural, política. Esses gêneros mais complexos e elaborados absorvem e modificam os gêneros primários.

Os gêneros primários, ao se tornarem componentes dos gêneros secundários, transformam-se dentro destes e adquirem uma característica particular: perdem sua relação imediata com a realidade existente e com a realidade dos enunciados alheios (BAKHTIN, 1992, p. 281).

Para melhor compreensão do fenômeno de absorção e transmutação dos gêneros primários pelos secundários, Bakhtin traz como exemplo uma carta ou um diálogo cotidiano. Uma carta ou um fragmento de conversação do dia-a-dia, quando inseridos em um romance, desvinculam-se da realidade comunicativa imediata, só conservando seus significados no plano de conteúdo do romance. Ou seja, não se trata mais de atividades verbais do cotidiano, e sim de uma atividade verbal elaborada e complexa. É importante lembrarmos que a matéria dos gêneros primário e secundário é a mesma: enunciados verbais. O que os diferencia é o grau de complexidade e elaboração em que se apresentam.

Firmada a consciência de que os gêneros estão não só associados mas inseridos no conceito de língua e comunicação, é importante expor e definir alguns conceitos diferentes entre si, tais como: tipo textual, gênero textual e domínio discursivo.

Os tipos textuais caracterizam-se como seqüência linguística (forma de linguagem), definida pela sua composição (aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais relações lógicas, estilo). Em geral, constituem os tipos textuais a narração, a argumentação, a exposição, a descrição e a injunção (MARCUSCHI, 2008, p.154). Ingedore Koch diz que os gêneros são formados por sequências diferenciadas denominadas tipos textuais e alerta para a importância de se ter em vista que a noção de gênero não se pode confundir com a noção de tipo. (p. 119).

Os gêneros textuais, por sua vez, são os textos que encontramos em nossa vida diária, em situações comunicativas e que, na visão de Marcuschi, apresentam padrões sociocomunicativos característicos, definidos por composição funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados na integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas. Em princípio, diferente dos tipos textuais, que podem ser classificados em meia dúzia de categorias, os gêneros textuais formam uma lista aberta, sem uma definição exata de sua diversidade. Alguns exemplos de gênero textual são: bilhete, reportagem, resenha, carta, romance, conto, receita, bula e assim por diante.

O domínio discursivo, na visão bakhtiniana, constitui uma esfera da atividade humana, uma vez que indica instâncias discursivas, tais como: discurso jurídico, discurso jornalístico, discurso religioso, etc. Constituem, dessa forma, práticas discursivas nas quais podemos identificar um conjunto de gêneros textuais próprios de uma rotina comunicativa.

Vimos que a comunicação é uma questão importante que se apresenta como ponto decisivo de vivência enquanto sujeito social que somos. Logo, falar de gênero textual é pensar sobre a língua e os diferentes padrões em que esta se manifesta, dependendo sempre da realidade em que se apresenta, da cultura, da situação e do contexto social em que a linguagem é utilizada.

A escolha do gênero, então, nunca se dá livremente, uma vez que optamos por usar, conforme os fatores citados, dentre os mais diversificados gêneros textuais e tipologias de textos que circulam na nossa sociedade, aquele que facilitará o entendimento à ação no contexto social ao qual estamos expostos. O trato dos gêneros diz respeito ao trato da língua em seu cotidiano nas mais diversas formas. Alguém já disse que é somente na linguagem e pela linguagem que existimos... 



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Comentários

  1. Amei! Uma explicação bem elaborada, porém de simples compreensão(pelo menos pra quem já gosta do tema). Parabéns, Angela!

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  2. eu nao entendi nada do que eu vim procurar, deveriam escrever esse trem em nossa lingua!

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  3. Obrigada. Realmente, um texto muito bem elaborado.

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  4. Ótimo texto e sucinto! Ele está direcionado aos professores de língua.

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  5. ótimo texto! possui certa dificuldade para aqueles que não possuem familiaridade com o tema, mas muito bom para esclarecer as dúvidas dos futuros professores de língua(s)!

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  6. Gostei da explicação!

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  7. Amei o texto,uma explicação compreensível e interessante.

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  8. Maravilhosa e sucinta explicação. Parabéns.

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  9. Entendi perfeitamente. Obrigada por compartilhar seu conhecimento.

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