Educação como Transformação da Sociedade

Artigos desta matéria:
1. A Função da Escola
1.1 Escola como Redentora da Sociedade
1.2 Escola como Reprodutora da Sociedade
1.3 Escola como Transformação da Sociedade
A terceira tendência não redime nem reproduz a sociedade, serve de meio para realizar um projeto de sociedade, uma transformação social. Acredita que é possível compreender a educação dentro da sociedade, considerando os seus determinantes e condicionantes, e ainda trabalhar pela sua democratização.

A tendência transformadora é crítica. Propõe-se descortinar a sociedade e utilizar-se das próprias contradições dessa para trabalhar, a partir da realidade concreta, pela sua transformação. Assim, quando bem direcionada, poderá estar a serviço de um projeto de libertação das maiorias dentro da sociedade.

A aplicabilidade dessa tendência na sociedade capitalista, não é tarefa simples, segundo o professor Saviani que indica a necessidade de se cuidar daquilo que é específico da escola, para que essa venha a cumprir um papel de mediação num projeto democratizador da sociedade. Assim afirma:
Do ponto de vista prático trata-se de retomar vigorosamente a luta contra a seletividade, a descriminação e o rebaixamento do ensino das camadas populares. Lutar contra a marginalidade, através da escola, significa engajar-se no esforço para garantir aos trabalhadores um ensino da melhor qualidade possível nas condições históricas atuais. O papel de uma teoria crítica da educação é dar substância concreta a essa bandeira de luta, de modo a evitar que ela seja apropriada e articulada com os interesses dominantes. (SAVIANI, p.36)
As três tendências apresentadas (redentora, reprodutora e reformadora) mostram as diferentes concepções acerca da função da escola e torna inquestionável a interrelação entre escola e sociedade. Tomar consciência de tais práticas, ser capaz de reconhecer seus pressupostos é fundamental para que se realize a mudança, a transformação. Concluir que a escola está, e sempre esteve, ligada à sociedade e a seus constituintes, é o que nos permite acreditar que mudar a escola pode, de alguma forma, influenciar na situação social. Eis a justificativa para a luta em prol da realização de reformas na escola, pois não devemos esperar de braços cruzados que a sociedade se modifique para, só então, modificar a escola (DELVAL, p.29).

É na escola pública que as classes dominadas estão buscando seu lugar ao sol. Queremos que elas deixem de sê-lo ou que, pelo menos, tomem consciência do seu poder de transformar a realidade estabelecida. Tal realidade está assim porque a maioria dominadora o quer, mas se eu acreditar que posso modificá-la, eu o farei...Nunca só, mas com aqueles que compartilham dos mesmos ideais de transformação (p.202).[1]

A necessidade de se reformar o sistema de ensino não é mera fantasia-utópica. O fracasso da escola não está ligado a um único fator e sim a um conjunto de fatores, ainda que não se possa defini-los a todos. Fala-se em fracasso da escola, por exemplo, ao constatar-se que os indivíduos, depois de muitos anos dentro do sistema de ensino, sabem muito pouco sobre o que lhes foi ensinado. O principal motivo para tal, na opinião de Delval, é que a escola, ainda hoje, tem por prioridade a moral e a ordem, a obediência à autoridade e o respeito às normas, esquecendo-se da transmissão de conhecimento.[2] Assim, a escola que temos hoje está em conformidade com o seu objetivo histórico que não tem compromisso com o saber ou com o conhecimento e sim com a obediência a autoridade e o respeito às normas. (DELVAL, 1998).

Para a professora Ida Regina Mendonça , a sociedade contemporânea ainda exige que a escola tenha como meta a preparação do aluno para o mercado de trabalho. Dessa forma, o desenvolvimento de ideias, conhecimentos, habilidades e comportamentos, têm de estar em consonância com as exigências da coletividade capitalista que considera a propriedade e não o indivíduo como cidadão. Mas a professora afirma que nos últimos anos há um movimento de mudança e de transformação do papel da escola, que está contrariando as concepções conservadoras impostas pela sociedade, pois:

a escola como espaço privilegiado de educação, deve assumir seu papel garantindo o desenvolvimento de ideias, de atitudes e de conhecimentos que proporcionem ao aluno, “sua incorporação eficaz no mundo civil, no âmbito da liberdade de consumo, da liberdade de escolha e participação política, da liberdade e responsabilidade na esfera da vida familiar e pública. (GOMES, 200, p.15)

Ainda que diagnosticado o fracasso da escola e conscientes de que a sua reforma não é ação de resultados imediatos, defendemos a sua importância e a sua existência contínua. Além do ensino curricular conteudista, devemos considerar o “currículo oculto” da escola, que trata de tudo o que não está explicitado como função distinta da instituição de ensino. O “currículo oculto” cuida, então, daquilo que é vivenciado pelo aluno nas relações interpessoais e é na vivência coletiva travada dentro da escola que o aluno toma consciência de si como agente social que é (MENDONÇA, 2009).

Para falarmos de reforma da escola, primeiro propomo-nos a uma reflexão crítica sobre a função e o papel que a escola ocupa na sociedade contemporânea. Destarte, a escola é um sistema composto de regras sociais condicionantes e de agentes sociais que atuam em tal campo. Logo, para uma efetiva ação transformadora, também se faz necessário refletirmos sobre as formas de agir do professor no contexto das suas práticas pedagógicas. Para tanto, é pertinente conhecermos o conceito de habitus, do sociólogo Pierre Bourdieu e os ‘tipos’ de abordagem em sala de aula, apontados por Fernando Becker, temas aos quais nos deteremos mais tarde.


[1] In: BARBARA, Leila e Ramos, Rosinda de Castro Guerra (orgs). Reflexões e ações no ensino-aprendizagem de línguas. Campinas: Mercado de Letras, 2003. O livro reúne relatos de professores, a fim de compartilhar ações e reflexões acerca do ensino e da reforma da escola. A citação é da professora Maria Bernadette Nogueira de Souza, autora do capítulo “A tormenta do buscar: refletir para transformar” (p. 195-205).

[2] "transmissão"; discordamos do autor e da forma como concebe a idéia de ensino. Ensino não se transmite, se compartilha (assim, também, a instituição Uniritter concebe o conhecimento e o ensino). Conceber o ensino como algo que possa ser transmitido é afirmar a superioridade do professor diante do aluno. O aluno nessas considerações é tido como 'tábula rasa', sendo o professor o detentor do conhecimento, idéia um pouco contraditória a nossa época e aos nossos propósitos de reestruturação e reflexão do ensino.

Angela Francisca Mendez de Oliveira
_________________________________________________________________________________
Referências


DELVAL, Juan. Crescer e Pensar. POA: Artmed, 1998.
SAVIANI, Dermeval. Escola e Democracia. SP: Cortez, 1987.
BECKER, Fernando. Educação e Construção do Conhecimento. POA: Artmed, 2001.
BARBARA, Leila e Ramos, Rosinda de Castro Guerra (orgs). Reflexões e Ações no Ensino-Aprendizagem de Línguas. Campinas: Mercado de Letras, 2003.
MENDONÇA, Ida Regina. A Função Social da Escola. Disponível em: http://www2.videolivraria.com.br/pdfs/14793.pdf <\hr>


ACOMPANHE ESTA MATÉRIA:
A Função da Escola
Educação como Redenção da Sociedade
Educação como Reprodução da Sociedade
Educação como Trasformação da Sociedade

Comentários