O Que Seria De Um País Sem Professores?














"Talvez seja esta a maior contribuição social desta instituição: a de preparar professores para tentar solucionar problemas básicos da educação, como os de leitura e de escrita, reiteradamente demonstrados em exames e provas oficiais. Senhores e senhoras, ter que lutar a cada final de semestre para preservar a continuidade de cursos que não têm outro objetivo que não o de preparar profissionais competentes para atuar em educação é um sintoma muito preocupante. Por isso repito aqui a frase de uma campanha promovida por nossos cursos: O que seria de um país sem professores?" ( Neiva Tebaldi )

Caros amigos e leitores do Cultura de Travesseiro,

Acredito que já comentei que sou estudante de Letras no Centro Universitário Ritter dos Reis, em Porto Alegre. No ano passado, 2009, fomos informados, eu e meus colegas, que a instituição deliberou extinguir o curso de Letras pela falta de alunos e pela irrisória procura ao curso de licenciatura.

Talvez, ou realmente, sejamos poucos, os estudantes e amantes de letras e literatura, mas somos imensuráveis, se considerada a vitalidade da nossa profissão na formação e no aprimoramento desta carente sociedade brasileira. O fato de sermos um pequeno grupo não nos desmotiva ou desqualifica, pois sabemos que, embora raros e pouco lucrativos, somos discentes de inigualável qualidade, preparados por profissionais altamente qualificados e de contagiante convicção sobre a grandeza de nossa missão.
Este pequeno e simplório texto nada mais é do que uma manifestação de apoio e de solidariedade a minha querida professora de português Neiva Tebaldi que, em seu discurso proferido em uma cerimônia de formatura, manifestou, a respeito de tal resolução,  não só seus sentimentos , mas o de todos nós - DISCENTES DO CURSO DE LETRAS DO CENTRO UNIVERSITÁRIO RITTER DOS REIS.



Verdades da Profissão de Professor

Ninguém nega o valor da educação e que um bom professor é imprescindível. Mas, ainda que desejem bons professores para seus filhos, poucos pais desejam que seus filhos sejam professores. Isso nos mostra o reconhecimento que o trabalho de educar é duro, difícil e necessário, mas que permitimos que esses profissionais continuem sendo desvalorizados. Apesar de mal remunerados, com baixo prestígio social e responsabilizados pelo fracasso da educação, grande parte resiste e continua apaixonada pelo seu trabalho.
A data é um convite para que todos, pais, alunos, sociedade, repensemos nossos papéis e nossas atitudes, pois com elas demonstramos o compromisso com a educação que queremos. Aos professores, fica o convite para que não descuidem de sua missão de educar, nem desanimem diante dos desafios, nem deixem de educar as pessoas para serem “águias” e não apenas “galinhas”. Pois, se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela, tampouco, a sociedade muda.
Paulo Freire




Boa noite a todos e a todas.
Inicialmente gostaria de cumprimentar
o Magnífico Sr. Reitor - Dr. Flávio de Almeida Reis,
a Professora Anelise Burmeister, colega de coordenação do curso de Letras,
a Prof. Ana Rangel, coordenadora do curso de Pedagogia,
a Prof. Denise La Salvia, paraninfa do curso de Pedagogia,
a Prof. Carla Borges, homenageada de Letras, demais prof. homenageados e participantes da mesa,
Também gostaria de cumprimentar os professores presentes na plateia, alunos, ex-alunos, familiares e amigos dos formandos,ijuie, finalmente, cumprimentar as formandas de ambos os cursos e, especialmente, as formandas de Letras de quem recebi a distinção de ser paraninfa.

Bem, em primeiro lugar, gostaria de dizer que estar no papel de paraninfo ou paraninfa é sempre uma grande responsabilidade, porque, de alguma forma, é estar representando todos os professores que, ao longo de 4 anos, contribuíram para que um grupo, embora desta vez muito reduzido, vencesse mais uma etapa de sua formação profissional. Por isso, peço licença às minhas queridas afilhadas para estender esta distinção ao meus colegas professores. Faço-o porque tenho certeza que vocês concordam com isso.

Em segundo lugar, gostaria de destacar a integração das formandas de dois cursos distintos em uma única cerimônia. Esta unidade que vocês demonstraram desde o início do processo, acreditem, foi a primeira grande lição que vocês deram como profissionais da educação.

E para uma breve reflexão sobre o profissional de educação, busquei, como o fiz em outros momentos, em Paulo Freire, uma definição da nossa tarefa que, segundo ele, é uma tarefa que requer de quem com ela se compromete um gosto especial de querer bem não só aos outros mas ao próprio processo que ela implica.

Para Freire, É impossível ensinar sem essa coragem de querer bem, sem a valentia dos que insistem mil vezes antes de uma desistência. É impossível ensinar sem a capacidade forjada, inventada, bem cuidada de amar. [...]

Segundo o educador que nos serve de inspiração, é preciso ousar, no sentido pleno desta palavra, para falar em amor sem temer ser chamado de piegas, de meloso, de acientífico, senão de anticientífico. Mas é preciso ousar para dizer, cientificamente [...] que estudamos, aprendemos, ensinamos, conhecemos com o nosso corpo inteiro. Com os ensinamentos, com as emoções, com os desejos, com os medos, com as dúvidas, com a paixão e também com a razão crítica. Jamais com esta apenas. É preciso ousar para jamais dicotomizar o cognitivo e o emocional.

É preciso ousar para ficar ou permanecer ensinando por longo tempo nas condições que conhecemos,[...]. É preciso ousar para continuar quando às vezes se pode deixar de fazê-lo, com vantagens materiais.

Essas foram palavras de Freire, e a elas acrescentaria que é preciso ousadia para seguir ensinando que é necessário agir com justiça e honestidade, quando valores éticos e morais parecem ter perdido o significado.

No entanto, talvez esteja justamente aí uma de nossas tarefas básicas: preparar para condutas morais e éticas. Tarefa essencial da família, porém nem sempre assumida por fatores que todos nós conhecemos bem.

É preciso ousadia para escolher, entre tantas outras opções, um curso de licenciatura, quando nos deparamos com escolas em condições precárias, com o desestímulo salarial, com relatos frequentes de desrespeito e de violência contra professores.

No entanto, é auspicioso ouvir dos alunos, ao final de um curso, após terem passado pelos estágios, portanto pelo confronto direto com a realidade: "agora tenho certeza quero ser professor ou professora. Há tanto que fazer e eu quero dar a minha modesta contribuição".

Quando ouço manifestações dessa natureza, as atribuo à vocação do Uniritter para a educação. Como professora desta Instituição desde 1996, sei o esforço institucional que vem sendo feito para tentar preservar os cursos de Educação. E neste momento gostaria de dizer, acredito que representando o pensamento de todo o corpo docente dos dois cursos, obrigado, Dr. Flávio, por nos permitir continuar lutando pela preservação das licenciaturas. Talvez seja esta a maior contribuição social desta instituição: a de preparar professores para tentar solucionar problemas básicos da educação, como os de leitura e de escrita, reiteradamente demonstrados em exames e provas oficiais.

Senhores e senhoras, ter que lutar a cada final de semestre para preservar a continuidade de cursos que não têm outro objetivo que não o de preparar profissionais competentes para atuar em educação é um sintoma muito preocupante. Por isso repito aqui a frase de uma campanha promovida por nossos cursos: O que seria de um país sem professores? E gostaria de convidá-los a uma reflexão:

quem prepararia candidatos aos cursos de Direito, Medicina, Design, Arquitetura, Informática, Engenharia e tantos outros? Vamos deixar que nossos professores da Educação Básica sejam preparados apenas pelos propalados cursos a distância, propostos por instituições, a maior parte delas desconhecidas e com objetivos mais comerciais?

Tendo dedicado muitos anos aos estudos da linguagem, sinceramente não consigo acreditar em uma formação eficiente de professores sem a troca face a face, sem a construção do conhecimento que decorre da reflexão produzida na interação presencial. Mas a propagação dos cursos a distancia, geralmente mais econômicos, é apenas um dos fatores que nos atrapalham.

Bem sabemos todos nós que o desinteresse pelas licenciaturas decorre de fatores sócio-econômicos estruturais. Quando o jovem começa a pensar em opções profissionais logicamente lembra profissionais bem remunerados, profissionais cuja imagem social lhes seja positiva.

Se os senhores fossem convidados a descrever, agora, o profissional da educação como o descreveria?

Oxalá, nossa Excelentíssima governadora, nosso presidente e todos os responsáveis diretos pela educação deste país tenham momentos em que possam refletir com lucidez sobre o tema: O que seria de um país sem professores? Voltaríamos à barbárie?

Todos os que aqui estão certamente têm alguma ligação com os formandos, portanto com professores. Convido-os, pois, a unirem-se à nossa luta. Precisamos preservar os cursos que, com muita seriedade, preparam professores para a atuação social comprometida com a melhoria da educação deste país.

Se levarmos em consideração o número de formandas em Letras, poderíamos dizer são apenas três, mas eu diria, senhores, são mais três que se somam à contribuição que o Uniritter vem dando há a quase duas décadas. Portanto, a vocês três e às formandas da Pedagogia, parabéns pela ousadia de acreditar na educação.

E, agora, mais particularmente, parabéns Elisângela, que depois de ter andado por outros países e ter comprovado o quanto o ensino de uma língua, seja a materna ou uma estrangeira, pode representar para a construção da cidadania de um indivíduo, escolheste o UniRitter para completar tua formação;

parabéns Isa, que vieste lá da região de Ijui já motivada para atuar em projetos de leitura e para dar continuidade aos teus ideais conosco; e obrigada pela tua contribuição junto ao projeto Ouro e Prata;

parabéns Tatiana que, mesmo tendo balançado diante da possibilidade de outras escolhas, decidiste ficar e, ao final do curso, as tuas palavras e a tua expressão inteira revelaram o prazer de estar em sala de aula.

O curso de Letras orgulha-se de vocês. Também sentimo-nos particularmente felizes porque duas de vocês, Elisângela e Isa, já fazem parte do grupo de ingressantes no Mestrado em Letras/2010. E, quem sabe a Tatiana, que demonstrou um grande empenho no final do curso, não empreende também mais uma caminhada conosco.

Queridas afilhadas e demais formandas, sejam felizes contribuindo com a formação de valores morais e éticos de que este país tanto carece e contribuindo com os múltiplos letramentos que a sociedade atual exige de seus cidadãos.

E, mais uma vez, muito obrigada por me ter concedido o privilégio de apadrinhá-las.

E muito obrigada a todos e a todas pela paciência de ouvir o desabafo de uma professora que acredita na educação porque ama realmente o que faz.

Professora Neiva Tebaldi

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